A Estória é Sua: Ilha dos Vorazes

Olá aventureiros! Chegamos aqui para mais um desfecho, dessa vez para Ilha dos Vorazes que começou em 02 de setembro.

Confira agora na Taverna do Joa’Kimm, onde boas estórias são contadas!

Vale ressaltar que A Estória é Sua é criação de Diego “Alface” e Vinícius Peres, uma série com algumas cenas que terão seu desfecho baseado na opinião dos seguidores da página no Facebook (@teatrodemesa). A maioria das decisões obtidas na página definiram o grande final.

Ilha dos Vorazes

Por Diego “Alface” Loyola e Vinícius Peres

Capitão Rui corria pelo convés enquanto os marujos gritavam em tom de alívio. “Terra à vista!”, bradavam. O navio por sorte não afundara depois daquela colisão repentina na madrugada anterior em algum “objeto” no meio do mar. Ninguém soube identificar o que era, nem tempo havia pra tal, pois o dano no casco certamente levaria a tripulação ao naufrágio.

Quando se aproximaram de terra firme duas coisas chamaram a atenção de todos. A primeira: uma fumaça subia serpenteante do centro da ilha. Segunda: havia uma pedra, como uma escultura, fincada na praia.

Aportaram.

Quando capitão Rui, um dos últimos a descer do bastante danificado navio, se aproximou de sua tripulação, percebendo que algo chamava a atenção de todos ali presentes.

Estavam vidrados, atônitos, rodeavam a pedra que repousava na areia. Era uma escultura perfeita, de um homem de chapéu, tapa olho (no olho esquerdo), cavanhaque cheio, camisa aberta com seus cordões emaranhados, expondo o peito de pelos voluptuosos e calça amarrotada. A estátua tinha um olhar de desespero, suas mãos, que apontavam pra frente, faziam uma espécie de barreira protetora como se quisessem tampar algo terrível de se ver.

Todos se viraram subitamente para o Capitão Rui.

O capitão se aproximou lentamente e ficou frente à frente com a intrigante e solitária rocha. Arregalou os olhos, mas não teve nenhuma reação.

Uma voz soou trêmula entre os homens que presenciavam a cena:

– Capitão. É você…

Capitão Rui ergueu a mão e lentamente aproximou-se da estátua. Seus olhos não desviavam da imagem à frente.

Tocou-a com a ponta dos dedos e recuou, não mais que uma fração de segundos. Todos observavam sem dar um pio.

Mal sabiam o que o Capitão “vira”:

Imagens em flashs inundaram sua mente, possíveis memórias de acontecimentos recentes e projeções do futuro passavam rapidamente em sua cabeça.

Teve a clara sensação de ter escutado em seu ouvido:

“É tempo de escolher entre os que podem e os que somente querem ver o que há no escuro…”

O capitão caiu para trás.

Acordou em uma improvisada tenda feita pela tripulação. Seu imediato estava ao seu lado.

– Capitão, finalmente acordou!

Capitão Rui se certificou de que seu tapa olho não havia sido tocado. Respirou aliviado. Notou que sua roupa havia sido trocada.

– O que é isso? – Levantando-se e apontando para si ao mesmo tempo que reunia seus pertencentes, como quem se prepara pra sair.

– Desculpe-me, senhor. Mas não poderia deixá-lo cinco dias com as mesmas vestes.

O Capitão, que esticava a mão pra pegar seu cinto, parou. Tardou a entender, e depois a acreditar, que ficara desacordado por tantos dias.

– Bem, senhor, eu cuidei de você esse tempo todo e, inclusive, anotei todas as coisas que dizia enquanto dormia. Estão aqui! – Disse o Imediato, empurrando um punhado de folhas para o Capitão.

– A propósito, a estátua amanheceu hoje com outro formato, os homens estão atormentados…

“Fome, intensa, dar de comer. De pedra, de pedra, com fome”

Rui lia logo na primeira linha escrita com garranchos de quem não tinha muito treino com a pena.

“Pai, te salvarei, fome, fome, de pedra, dar de comer”

O resto do texto continuava nessa mesma linha, repetindo as mesmas palavras com pequenas variações.

Quando levantou a cabeça, Rui viu à entrada da cabana José, um dos marujos, parado olhando para ele com ar de desconfiança.

– Rômulo, um dedo de prosa aqui fora, por favor? – Disse José ao imediato, que se levanta pede licença ao capitão e o acompanha.

Rômulo segue o marujo até outros quatro homens reunidos discutindo algum assunto muito importante, pois estavam um pouco exaltados. Quando os dois se aproximam os homens que conversavam fazem repentino silêncio e ficam olhando para Rômulo.

José respira fundo, parece estar tomando coragem para falar algo:

– A tripulação está convencida de que aquela é a estátua do “Capitão Maldito” das lendas.

– Deixe de besteira, homem! – Atalhou Rômulo – Deve haver alguma explicação para tudo. Que lenda é essa?

– Sob a bandeira de nosso mui excelentíssimo Rei – iniciou José como se estivesse com medo de falar alto – navegava um Capitão, Miguel de Bragança, um homem muito respeitado por sua bravura e habilidade no mar, até que seu navio naufragou perto de uma ilha onde ele e três homens conseguiram chegar a nado, uma ilha que tinha uma fumaça perene. Na tentativa de explorar a ilha e descobrir de onde vinha a fumaça, Miguel caiu em uma gruta e ficou dias desaparecido, quando voltou ele estava diferente e seu olho esquerdo que parecia ter sido machucado, brilhava a noite. Um navio mercante resgatou eles, mas havia sobrado somente o capitão e um marujo que havia perdido a sanidade e dizia coisas sem sentido, coisas como a que o Capitão Miguel roubava a alma dos homens. Depois de alguns estranhos incidentes que quase levou a um motim, o capitão do navio decidiu deixar Miguel de volta na ilha, sozinho.

Rômulo observava atentamente cada palavra, quando se pronunciou:

– Miguel? Mas este não é o nome do desaparecido pai do Capitão Rui??

Os marujos assentiram com um aceno de cabeça. José emendou enquanto alisava o cabo de seu punhal:

– Precisamos dar fim à maldição. O Capitão Rui deve morrer. Você está conosco, Rômulo?

Rômulo ouvia as palavras dos marujos, mas seu coração dizia que a lealdade ao seu Capitão de muitas aventuras deveria ser mantida.

-Vocês estão enlouquecendo mesmo, sem o Capitão Rui nossa chance de sobrevivência é mínima.

Houve um silêncio constrangedor como se estivessem refletindo. Sem dizer mais nada, o Imediato deu meia volta e seguiu de volta à tenda onde deixara o capitão. O sol já estava baixo no céu quando ele chegou à tenda improvisada e percebeu que ela estava vazia, sobre a esteira onde o capitão tinha dormido estava seu tapa-olho.

Rômulo volta para falar com os outros homens quando um deles veio correndo em sua direção com os olhos arregalados.

-Rômulo, Rômulo! O José sumiu, ele tinha ido no mato fazer suas necessidades e não voltou mais, tentamos achá-lo, mas nada.

Antes que o imediato pudesse pensar em algo, Estênio, o coxo, veio claudicando e com o braço erguido chamando Rômulo.

-José está morto! – Disse Estênio, esbaforido e com sua boca já sem dentes, e continuou – Só o reconheci pelo anel que usava pois ele estava esquelético como se tivesse sido morto há dias. E a estátua – parou pra recuperar o fôlego – ela simplesmente desapareceu!

O desespero tomou conta de todos. Alguns se lançaram ao mar de forma insana. Outros brigavam entre si pra decidir quem usaria o bote de emergência pra escapar da ilha, inclusive com tiros, cortes e muito sangue. Outros simplesmente surtaram delirando em devaneios e lamentos.

Em meio a todo esse caos alguns dos homens começaram a gritar e apontar para o alto. A fumaça serpenteante no centro da ilha cessara.

Rômulo não pensou duas vezes, disparou para o centro da ilha, desbravando a vegetação pesada entre tropeços e escorregões. Perdeu a noção de quanto tempo correu e qual direção seguiu até a vegetação se abrir dando luz a uma clareira. Em seu centro havia uma fenda oval e Rômulo percebeu que era dali que nascia a fumaça. Esfregou as mãos e se aproximou lentamente. Se ajoelhou e se inclinou para olhar o que havia em seu núcleo, mas estava tudo escuro, o máximo que se via eram nuances da fumaça que ainda subia aos céus por entre as copas das árvores.

Teve a impressão de ouvir algo e se concentrou pra prestar mais atenção. Sem perceber foi se aproximando mais e mais da fenda. Até que um sussurro pareceu soar bem baixinho em seu ouvido.

-Vorazes… eternos…

Rômulo pensou estar alucinado, mas a voz parecia familiar, lembrava a de seu capitão!

– Sua mão, me dê sua mão… – a voz continuou.

Rômulo estende lentamente sua mão em direção a fenda, gotas de suor pendem de sua testa. A cada centímetro mais ao fundo da cratera mais dúvidas e medo pairam em sua mente e coração.

-Mais perto, mais perto – teve a sensação de ouvir um murmúrio.

Seus olhos vidrados sequer piscavam, ele forçava a visão pra tentar ver o que havia ali.

Sentiu um toque em sua mão, e quando pensou em recuar ficou preso, algo o agarrara firmemente.

Em seguida, uma mão tocou seu ombro e uma voz falou:

-Você me foi útil e fiel por muitos anos, sinta-se honrado por fazer parte disso.

A voz era de Capitão Rui. Rômulo conseguiu olhar pra trás e a última visão que teve foi a de seu olho, o que o tapa-olho cobria, reluzir fortemente.

Foi tragado fenda adentro enquanto gritava em desespero.

-Espero saciar sua fome, meu pai. – Disse ajoelhado perante o buraco negro.

Na praia o caos permanecia, ainda mais com o sumiço do Imediato. Porém, algo fez com que todos parassem o que estivessem fazendo.

Era Capitão Rui.

Caminhava lentamente saindo do meio das árvores em direção à tripulação.

-Já consertaram o navio?

– Fim –

Confira no Facebook: Cena I | Cena II | Cena III | Cena IV | Cena V

Vamos bater um papo caríssimo leitor ou leitora, o que achou dessa estória? Deixe o seu comentário abaixo.

About Vinícius Peres

Vinícius Peres, engenheiro e microempresário. Ingressou no RPG no ano final da década de 90 com o belíssimo e clássico "Livro dos Monstros" de AD&D 2ed. acompanhado de um mísero d8. Se apaixonou pela ideia de criar histórias coletivas protagonizadas por personagens próprios e desde então nunca mais abandonou o hobby.

View all posts by Vinícius Peres

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *